sábado, 26 de novembro de 2011

Resenha do Livro " O CASO DOS EXPLORADORES DE CAVERNA"


O Caso dos exploradores de caverna..

A obra fictícia narra a história de cinco desafortunados exploradores amadores que ao entrarem em uma caverna ficam soterrados, depois de passados vinte dias incomunicáveis com o mundo exterior, conseguiram através de uma máquina sem fio, levada pelos próprios exploradores, estabelecer  comunicação com o mundo exterior, foram então  informados pela equipe de resgate que seriam necessários não menos que dez dias para serem resgatados, por não terem provisões suficientes para esperar tal prazo perguntaram a um médico presente na equipe de resgate se conseguiriam sobreviver sem alimentos por dez dias, o  médico lhes informou que nesse prazo poderiam morrer por inanição, após oito horas novamente sem comunicação; conseguiram finalmente falar com o médico da equipe e então Wethmore falando por todo o grupo perguntou se eles poderiam sobreviver se consumissem a carne do corpo de um deles. O médico ainda que relutante disse que sim. Wethmore buscando conselho junto ao médico quis saber se era aconselhável tirar a sorte para saber qual deles deveria ser sacrificado, o médico se escusou de responder tal pergunta, foi então questionado se havia alguma autoridade presente, como um Juiz ou outro oficial do governo que pudesse responder tal questão, Ninguém se manifestou, foi ainda solicitado saber se havia algum sacerdote ou ministro para ajudar a resolver tal imbróglio, e nenhuma pessoa foi achada para ajudar na solução. A bateria do comunicador exauriu-se e encerraram-se as comunicações.
Decidiram então que a única maneira de sobreviverem seria sacrificar algum integrante do grupo para que servisse de alimento para os outros. Discutiram a ideia e de  comum acordo, decidiram que a sorte seria decidida pelos dados, levados pelo autor da ideia Whetmore. Quem sugeriu a ideia, infortunadamente  tornou-se a vitima, contudo, antes de chegarem a dar cabo do famigerado plano, o próprio autor da ideia, renunciou a sua participação do macabro intento, o que não foi aceito pelos outros integrantes, alegando já haverem celebrado verbalmente um contrato; e a sorte – ou falta dela – poderia cair sobre quaisquer um dos integrantes. Dessa forma lançaram-se os dados por um terceiro, e tendo menor sorte Whetmore, foi então sacrificado para a sobrevivência do grupo no vigésimo terceiro dia dentro da caverna.
Trinta e dois dias após o desastre, os exploradores foram então resgatados e após terem sido tratados com a devida atenção em função do desastre ocorrido, foram então indiciados pelo assassinato de Roger Whetmore.
Esta historia fictícia se passa no condado de  Stowfield em 4300 e serve como pano de fundo para debater dois pontos fundamentais do Direito, o Direito Natural e o Direito Positivo. Apesar de terem sido condenados à forca em primeira instância, os quatro acusados recorrem dessa decisão à Suprema Corte de Newgarth, e, dentro desse contexto surgem todas as dúvidas e conflitos hermenêuticos para interpretar as leis. Os juízes escolhidos para votarem pela  Corte do presidente Truepenny, o fazem cada um segundo a sua ótica a sua interpretação da letra da lei, e o caso em si, em que estão inseridas quatro vidas.

“Parece-me que, em se tratando de um caso tão extraordinário, o júri e o juiz seguiram o curso que não foi simplesmente justo e criterioso, mas o único curso a ser tomado sob a lei vigente. A linguagem do estatuto é bem conhecida: “Qualquer um que, de própria vontade, retira a vida de outrem, deverá ser punido com a morte”10. Esse estatuto não permite exceção aplicável a este caso, muito embora nossas simpatias possam nos inclinar a fazer concessões, devido à trágica situação na qual essas pessoas estavam envolvidas.” Truepenny, C.J. - Presidente

O Presidente do tribunal Truepenny, C.J., orienta os outros quatro juízes pela manutenção da decisão  do tribunal de primeira instância acreditando que o chefe do executivo atenderia as solicitações de petições endereçadas a este, demonstrado claramente sua posição positivista.



“Do meu entendimento, não acredito que nossa lei nos compele a conclusões monstruosas, que tais pessoas sejam assassinos. Acredito, muito pelo contrário, que ela declara que eles devam ser inocentados de qualquer crime. Apresento minha conclusão baseada em duas bases independentes, ambas as quais são, sozinhas, suficientes para justificar a absolvição de tais réus.
A primeira repousa na premissa que poderá levantar oposição até ser examinada imparcialmente. Tomo a posição de que a lei positiva e promulgada deste Commonwealth, incluindo todos os seus estatutos e precedentes, são inaplicáveis a este caso, e que o caso é governado por escrituras antigas da Europa e América, chamadas de “lei natural” Foster, J. - Ministro

Segundo a ótica o Juiz Foster a lei serve para pessoas naturais e que vivem em sociedade em comum acordo com as leis por elas estabelecida, dessa forma tão importante quanto respeitar uma lei, ainda que natural “não atentar contra a vida”, é também importante defender a vida, nesse caso a vida dos quatro indivíduos restantes. Também observa que os cinco estavam numa realidade diferente a nossa, e viviam numa sociedade onde eles criaram as leis. Portanto o Juiz Foster, absolveu os quatro integrantes da equipe, dentro da sua visão de Direito Natural.

“No desempenho das minhas funções como ministro deste tribunal, normalmente sou capaz de dissociar os lados emocional e racional das minhas reações, e decidir o caso apresentado, unicamente, com base na racionalidade. No lado emocional, acho-me dividido entre a simpatia por essas pessoas e um sentimento de aborrecimento e repugnância para com o ato monstruoso que elas cometeram. Tenho esperança de que seria capaz de colocar estas emoções contraditórias de lado, como irrelevantes, e decidir o caso com base em uma demonstração lógica e convincente como resultado requerido pela nossa lei. Infelizmente, essa possibilidade não me foi concedida” Tatting, J. - Ministro

Pode-se perceber claramente que o Juiz Tatting, decidiu seu voto observando a lei, e a condição natural de cada integrante que infortuitamente não teve alternativa a não ser manter-se vivo, demonstra claramente neutralidade em seu voto. Absteve-se do julgamento. Embora seja positivista, suas emoções orientadas pelo Direito Natural não permitiram um julgamento imparcial.

“Gostaria de afirmar que se fosse o Chefe do Executivo, iria além, no sentido da direção da clemência, do que as petições endereçadas a ele. Perdoaria todas essas pessoas conjuntamente, porque acredito que elas já sofreram o bastante para pagar por qualquer ofensa que possam ter cometido. Gostaria, também, que essa afirmação fosse entendida como feita na minha capacidade de cidadão, que por acidente de seu ofício, tornou-se familiarizado, intimamente, com os fatos deste caso. No cumprimento das minhas funções como juiz, nunca seria minha função endereçar instruções para o Chefe do Executivo, nem tomar em consideração o que ele poderá ou não fazer, para chegar a minha conclusão, que deverá ser controlada, unicamente, pela lei deste Commonwealth.
A segunda questão que gostaria de colocar é a de que decidindo se os atos dessas pessoas foram “certos” ou “errados”, “iníquos” ou “bons”. Também é uma questão irrelevante para o cumprimento do meu ofício como juiz, que fez juramento para aplicar, não os meus conceitos de moralidade, mas a lei do país. Em se colocando essa questão de uma só maneira, penso que posso, também, seguramente rejeitar, sem comentários, a primeira e mais poética porção da opinião do meu colega Foster”  Keen, J. -Ministro

O Voto do Juiz Keen, J, inicialmente aponta que quem deveria tomar a decisão no caso apresentado deveria ser o chefe do executivo, o qual teria o poder da clemência, no entanto, discorda do juiz foster, “é convicção humana de que o assassinato é injusto e que algo deve ser feito ao homem que o comete”, e vota pela condenação dos quatro acusados. Baseado a na sua função como Juiz fundamentado no Direito Positivo.


“O que você pensa que a Suprema Corte deveria fazer com os espeleólogos?”. Mais ou menos 90% expressaram sua opinião de que os réus deveriam ser perdoados ou liberados com uma punição simbólica. Está perfeitamente claro como o público se sente sobre este caso. Nós poderíamos saber sem esta pesquisa de opinião, naturalmente, somente baseados no senso comum, ou mesmo, em observando este Tribunal que está, aparentemente, quatro juízes e meio, ou seja, noventa por cento a favor da opinião pública.
Torna-se óbvio não somente o que deveríamos fazer, mas o que devemos fazer se pretendemos preservar entre a opinião pública e esta Corte um razoável e decente acordo. Ou seja, declarar essas pessoas inocentes não envolverá, necessariamente, qualquer sofisma ou truque indigno. Nenhum princípio de hermenêutica das leis é necessário para que não seja consistente com as práticas jurisdicionais deste Tribunal. Certamente, nenhum leigo pensaria que, deixando estas pessoas livres, nós estaríamos esticando o estatuto mais do que nossos antepassados fizeram quando criaram a legítima defesa.” Handy, J. - Ministro

O Juiz Handy, defende que sejam observados também vários outros fatores que levaram a fatídica decisão de sacrificar o amigo em função de preservar a vida de outros quatro integrantes, e cita ainda o contrato firmado por eles, as lacunas que a lei apresenta, e o forte clamor popular que o caso gerou, sugerindo que a lei serve acima de tudo para atender a sociedade que a criou, vota pela absolvição dos quatro. O Juiz Handy é a favor da reforma da sentença, temendo pela opinião dos outros juízes, uma vez que, para Handy a opinião pública é relevante e que converge para a inocência.

Após análise do caso pelos cinco juízes, em que um absteve-se de votar o Juiz Tatting, duas decisões foram por absolvição Juiz Foster, e Juiz Handy, J   , e duas condenações Juiz Truepenny e Keen. Tendo em vista o empate na decisão foi confirmada a decisão de primeira instância e os quatro acusados foram condenados a forca.
“O Direito está em função da vida social. A sua finalidade é a de favorecer o amplo relacionamento entre as pessoas e os grupos sociais, ao separar o ilícito do ilícito, segundo valores de convivência que a própria sociedade elege, o ordenamento jurídico torna possível os nexos de cooperação e disciplina a competição, estabelecendo as limitações necessárias ao equilíbrio e à justiça nas relações”  Nader, Paulo – Introdução ao estudo do Direito 31ª edição/2009


Alguns questionamentos são relevantes no Caso dos Exploradores de Caverna, - Estando eles em uma sociedade paralela, e formulando suas próprias leis, estariam eles infligindo algum Direito estranho à realidade em que eles se encontravam? – Segundo o Juiz Foster as leis estabelecidas dentro da caverna estavam de acordo com o principio de Direito Natural, onde o homem segue o principio natural das coisas, não havia alternativa, se não seguir adiante tentando preservar a vida de acordo com as possibilidades presente.
“ Direito e Sociedade são entidades congênitas que em que se pressupõem: O Direito não tem existência em si próprio. Ele existe na sociedade. A sua causa material está nas relações de vida. A sociedade, ao mesmo tempo, é fonte criadora e área de atuação do Direito, seu foco de convergência. Existindo em função da sociedade”
Nader, Paulo – Introdução ao estudo do Direito 31ª edição/2009

   Segundo Paulo Nader o Direito nasce na sociedade para atendê-la e não existiria um sem o outro.
Os votos dos Juízes, Truepenny, C. J. e Keen J, baseados em conceitos positivistas, mostram claramente como o homem precisa de apoiar em normas escritas, codificadas para tomar decisões difíceis de julgamento, embora houvesse entendimento da condição natural em que se apresentavam os atores do caso concreto, ambos preferiram seguir a letra da lei e decidir pelo código estabelecido, opinando pela manutenção a sentença prolatada na 1ª Instância, condenando os quatro acusados pela norma agendi (norma de agir) e facultas agendi (faculdade de agir).
Os votos dos juízes  Foster J. e Handy J., demonstraram que, embora afirmem que sua condição de juízes os obriga a primarem pelo Direito Positivo, baseiam suas decisões, fortemente influenciados pelas regras do Direito Natural, quando decidem pela reforma da sentença da 1ª Instância.
O fato do juiz Tatting, J., ter se recusado a participar da decisão do caso apresentado, levou ao empate das decisões, motivo pelo qual foi confirmada a sentença condenatória do Tribunal de primeira instância, sendo determinado hora e data para a execução, quando o verdugo público procederia com toda a diligência até que os acusados morressem na forca.
Ressalta-se ainda, que o autor nada informou a respeito das solicitações de clemência feitas ao chefe do executivo pelo juízo de primeira instância, uma vez que o texto deixa claro que existia um forte clamor popular pela reforma da sentença, uma vez que o Estado ceifou a vida de outras dez pessoas na intenção de salvar o grupo que estava na caverna, ou seja, quem será condenado por estas mortes. Afinal: É justo a morte de dez pessoas para salvar a vida de outras quatro? Porque então condenar estes quatro em razão da morte de um?   

















REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FULLER, LON L. O caso dos exploradores de caverna.. Tradução do original  inglês e introdução por Plauto Fraco de Azevedo - Edição especial: Fabris 2008

NADER, PAULO. Introdução ao Estudo do Direito – 31ª Edição. Editora Forense/2009

REALE, MIGUEL. Lições preliminares de Direito – 27ª Edição. Editora Saraiva/2002

REVISTA ELETRÔNICA JUS NAVIGANDI disponível em
http://jus.com.br/revista/texto/6/direito-natural-e-direito-positivo acesso em 21 de novembro de 2011


RESPIRANDO DIREITO disponível em
http://respirandodireito.blogspot.com/2008/03/direito-natural-x-direito-positivo.html acesso em 24 de novembro de 2011








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